6 de jul. de 2010

"Vá chorar no pé do caboco" - Brilha o sol ao 2 julho!

O dia da festa do povo

"Considero o 2 de julho a mais bonita festa da Bahia. Isso porque é difícil ver nas outras uma mistura tão bem acabada de política, religião e festa.

Afinal, onde existe uma parada cívica com capoeiristas, gente vestida de baiana e vaqueiros devidamente trajados misturados às representações oficiais da Polícia Militar e da Marinha?

Além disso, muita gente vai ali para fazer orações e agradecimentos aos caboclos do 2 de julho já sincretizados às entidades homônimas saudadas nos candomblés baianos. E como ignorar o surgimento desta festa?

No dia 2 de julho de 1823, o povão, no mais puro baianês, estava retado. Depois de tantas promessas o Brasil estava livre de Portugal, mas descendentes de índios, escravos e libertos, muitos dos quais tinham entrado na guerra ou perdido familiares nos combates, continuavam do mesmo jeito: pobres e sem liberdade nenhuma.

Aquela história de Exército Libertador não apagou as diferneças entre elite e povo. Tudo continuava como dantes no quartel de Abrantes para este último.

E talvez tenha sido aí que começou a tomar forma um outro famoso ditado baiano: “Vá chorar no pé do caboco”. Ou seja: “se virem”. O povo resolveu apelar para o caboclo, literalmente.

Um movimento popular fez o mesmo caminho que as tropas tinham feito um ano antes tendo à frente uma canhoneira portuguesa transformada em carroça que levava um velho descendente de índio. Era uma caricatura da entrada das tropas brasileiras vencedoras. Simbólico que à frente estivesse um representante do povo.

E ai de quem tentou alterar o que os donos da festa decidiram fazer. Conta-se, por exemplo, que no final do século XIX o comandante de armas que era uma espécie de prefeito da cidade decidiu que a estátua do caboclo, pois ela já havia sido feita, não iria sair mais. A decisão era por conta do símbolo de Portugal na estátua: uma serpente sendo morta pelo caboclo.

O cidadão era descendente de português e se sentiu ofendido. No lugar do caboclo ele queria uma imagem feminina para homenagear Catarina Paraguaçu.

Pois a associação dos veteranos da guerra mandou um recado: ou o caboclo saía ou eles iam pegar em armas e ia correr sangue. Seria uma guerra civil em defesa do caboclo. O comandante recuou, o caboclo foi para a rua e melhor ainda: ganhou uma companhia feminina, a cabocla.

Ou seja: no 2 de julho, como diz o professor Cid Teixeira, autoridade é que é penetra. Mesmo com todo o discurso de festa cívica a irreverência original está lá nesta característica de parada militar embolada a manifestações culturais diversas.

Lembro que um maestro de uma banda militar me contou que na primeira vez em que foi reger no desfile ficou sem entender nada. Carioca, ele imaginava que a festa da Independência da Bahia, a maior data cívica do Estado, era uma espécie de 7 de setembro.

Para a sua surpresa o que viu foi o povo gritando e aplaudindo o carro dos caboclos, correndo para tocá-los. Na confusão o seu quepe foi jogado para longe e ele teve que se virar para reger a banda como deu.

A surpresa do integrante da Marinha é a típica reação de quem é de fora quando vê o 2 de julho, o que só prova a sua característica de festa especial.

Que bom que o povo baiano consegue manter essa sua rebeldia. No 2 de julho o povo aplaude quem acha que deve, vaia quem acha que merece e não é à toa que políticos se esforçam para seguir atrás do cortejo rodeado de cabos eleitorais.

Aliás o 2 de julho é termômetro para quem se aventura na disputa das urnas para saber se está bem ou em baixa.

Mas a volta dos caboclos alguns dias depois é ainda mais irreverente. Não tem cerimônia oficial, mas muita festa.

Enfim, o 2 de julho é uma celebração de independência desse jeito povão de ser. E viva aos caboclos! Atrás deles só não vai quem não pode"
Cleidiana Ramos.
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